A celebração da Páscoa no Ano da Fé nos proporciona a oportunidade de
uma reflexão sobre a questão central da nossa fé, que é a ressurreição de Jesus
Cristo dentre os mortos, e sobre seu significado para nós e para o mundo.
Não é só
de hoje que a afirmação da ressurreição de Jesus é posta em dúvida por muitas
pessoas: ela foi contestada e posta em dúvida desde o início; os próprios
apóstolos não quiseram crer nas aparições do Ressuscitado e Jesus teve muito
trabalho para convencê-los de que era ele mesmo, e não algum fantasma, que
estava diante deles, nem se tratava de uma alucinação. O final do Evangelho de
São Marcos mostra de maneira patética como os apóstolos continuaram incrédulos
e, por isso, foram repreendidos por Jesus. Mesmo assim, o Mestre os enviou como
missionários ao mundo para serem testemunhas dele e de sua ressurreição.
Só isso
já é um argumento muito forte em favor da verdade sobre a ressurreição de
Jesus. As primeiras testemunhas desse evento inaudito não foram pessoas
crédulas ou fanáticas, nem animadas pelo propósito de se colocarem de acordo
para passar ao mundo uma farsa bem inventada... Eles foram duros para crer. Mas
a verdade da ressurreição se impôs a eles de tal maneira que não a podiam
negar. E assim, eles acabaram dando a vida pela afirmação dessa verdade. Diante
das autoridades, que os mandavam parar de falar que Jesus estava vivo, eles
diziam: “não podemos deixar de falar do que vimos e ouvimos! Nós somos
testemunhas do que Deus realizou em favor de Jesus”. E seu testemunho é lúcido
e sólido.
O núcleo
central da verdade sobre a ressurreição de Jesus é afirmado de maneira lapidar
no Credo. Após afirmar a sua morte e sepultura, “sob Pôncio Pilatos”, como um
fato historicamente situado, a Igreja proclama: “ressuscitou dos mortos ao
terceiro dia, conforme as Escrituras”. Esse testemunho aparece esparso em todo
o Novo Testamento; portanto, fazia parte da pregação dos apóstolos e da Igreja
desde as suas primeiras origens. Os Atos dos Apóstolos nos trazem testemunhos
eloquentes sobre a ressurreição de Jesus, e São Paulo chega a dizer: “se Jesus
Cristo não ressuscitou dos mortos, é vã a nossa fé”.
Proclamando
a ressurreição de Jesus, nós afirmamos que Jesus Cristo, depois de ter sido
matado e sepultado, não ficou entregue à morte, mas superou a morte e foi visto
vivo, encontrando-se novamente com os seus apóstolos, mas também outras
pessoas; falou com elas e confirmou os ensinamentos e as escolhas que fizera
antes de sua morte. A afirmação leva sempre uma certeza: aquele que estivera
morto, agora está vivo e se encontrou com os seus discípulos. A ressurreição é
atribuída a uma especial intervenção de Deus em favor de Jesus: Deus estava com
ele e o fez passar da morte para a vida. Jesus era um inocente e justo, por
isso, Deus interveio em seu favor e mostrou que Jesus era fidedigno e não um
enganador de multidões; Deus testemunhou, assim, ser verdade tudo o que Jesus
ensinou e significou para os homens.
Mas isso
ainda não é tudo: a ressurreição de Jesus é bem mais que um fato maravilhoso
situado no passado e vai muito além de dizer que Jesus passou a viver
novamente. O Ressuscitado não voltou à vida deste mundo, mas entrou na glória
de Deus; sua santa humanidade passou a participar da glória da divindade, que
antes estava oculta na sua vida terrena. Por isso, já na pregação de Pedro,
afirma-se que Jesus assentou-se à direita de Deus e tornou o juiz dos vivos e
dos mortos.
A Igreja
também afirma, com os apóstolos, que o Ressuscitado continua presente e atuante
com seus discípulos e com todos os que ouvem e acolhem sua Palavra; continua a
ser o Mestre e Senhor da Igreja, a caminhar com ela, a orientar seus passos, a
falar por meio dela e a confirmar a sua pregação. Tudo isso não aconteceu
apenas na primeira geração dos discípulos, mas ao longo dos séculos, até o
presente.
Jesus
Cristo ressuscitado reúne em torno de si a Igreja, anima-a mediante os dons do
seu Espírito, alimenta-a na Palavra e na Eucaristia, santifica-a com os
sacramentos e a prática da vida cristã. O Ressuscitado está vivo na comunidade
reunida em seu nome, na pessoa dos seus ministros, que o representam no serviço
aos irmãos; está presente em cada pessoa, por ele assumida como irmão e irmã,
especialmente naqueles que mais sofrem e com as quais ele se identifica. O
Ressuscitado vive entre nós! Aleluia!
Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 26.03.2013
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo